segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Memórias do Subsolo

Foi um privilégio assistir Mika Lins, em Memórias do Subsolo, de Dostoiévski .
Mika, defende com tanto primor seu personagem, que ficamos absorvidos, por aquele homem ressentido, em sua difícil rotina do subsolo:
"Sou um homem doente... um homem mau. Um homem desagradável."
"Sou desconfiado e me ofendo com facilidade."
O homem do subsolo questiona a civilização burguesa e, sem distinções ataca tudo e todos, provocando com humor ácido nossa reflexão:
"Mas vejamos agora esse camundongo em ação. Suponhamos, por exemplo, que ele esteja ofendido (quase sempre está) e queira vingar-se. Acumula-se nele, provavelmente, mais rancor que em l´homme de la nature et de la verité, porque l´homme de la nature et de la verité, devido à sua inata estupidez, considera a sua vingança um simples ato de justiça. Já o camundongo, em virtude de sua consciência hipertrofiada, nega haver nisso qualquer justiça."

Uma equipe que trabalha com plasticidade e rigor: texto adaptado por Mika Lins e Ana Saggese, a partir da tradução de Boris Schnaiderman, dirigido por Cassio Brasil, responsável também pela cenografia.
Em cena, ancorada em profundo estudo, Mika defende com garra, o seu personagem. Ela, sem exagero em suas expressões corporais, sem a menor caricatura, deixa a platéia com a sensação de estar realmente diante de um homem.
No subterrâneo de um prédio, entre a ironia e amargura e, com toda a veracidade vemos o funcionário público enclausurado.
"Afinal de contas, eu provavelmente nunca saberia o que fazer com minha magnanimidade – nem perdoar, porque meu ofensor pode ter me esbofeteado em obediência às leis da natureza; nem esquecer, pois, mesmo que se trate das leis da natureza, ainda assim é ofensivo."
Mika Lins, nesse personagem que olha tão verdadeiramente para dentro de si, mostra que todos temos um pouco desse homem do subsolo.